Milene Caroline Costa e Silva, de 17 anos, começou a trabalhar neste ano na administração financeira da Itambé, em Minas. Sem nunca ter atuado na área, ela teve a oportunidade de vivenciar as dores e as alegrias do primeiro emprego. Com as regras de distanciamento social impostas pela pandemia da Covid-19, mudanças vieram, como a redução do período que passa na empresa e a realização de cursos em casa. A adolescente, que já pensa em graduar-se na área, faz parte de uma minoria de jovens aprendizes que não foram afetados pela crise desencadeada pelo coronavírus, apenas 37%. Do outro lado, estão 52% de iniciantes no mercado de trabalho com o contrato suspenso. Os números constam de levantamento do Instituto Brasileiro de Aprendizagem, o Saber, feito durante a pandemia, com 1.200 jovens aprendizes de todo o país.
Dos iniciantes no mercado de trabalho que se mantiveram atuando, 23% estão na modalidade home office, e 14%, como Milena, continuam presencialmente, prática permitida só para maiores de 18 anos. “Temos horas teóricas (curso) e práticas. Nos dias em em que eu deveria estar presente no curso, eu o faço de forma online. Nos demais dias, faço os cursos gratuitos”, conta Milena, que trabalha de segunda a sexta, das 13h às 17h.
Investir em novos cursos é uma das alternativas a que recorrem os que precisam voltar a colaborar com a renda familiar. Em até 16% das famílias dos aprendizes no Brasil, a arrecadação antes da pandemia era de até um salário mínimo. Nesses casos, o jovem é a única fonte de proventos da casa. Outros 79,2% dos lares possuíam receita entre um e cinco salários mínimos, e 18% estavam inseridos em programas de auxílio governamental. No contexto atual, 68,5% sofreram reduções na receita coletiva familiar.
“Essa renda perdida por esses jovens impacta, e muito, as famílias, porque eles também são provedores. Antes de se iniciarem no mercado de trabalho, esses jovens têm outros provedores na família. Mas, depois que eles ingressam, passam a ajudar, e a renda deles se torna muito importante para a família. Percebemos que 47% dos jovens atuantes tiveram uma redução no salário, porque tiveram contrato de trabalho alterado de alguma forma. Além disso, outros familiares dos jovens ou perderam seus empregos, ou também tiveram suspensão dos seus contratos”, explica Roberta Teixeira, assistente educacional do Instituto Brasileiro de Aprendizagem.
Para fazer o levantamento, o instituto ouviu jovens com faixa acima dos 16 anos predominantemente. No Brasil, a legislação preconiza que o adolescente trabalhe a partir dos 14 anos, podendo ser considerado um jovem aprendiz até os 24 anos.
Lado emocional
Como resultado do distanciamento social, 54,2% dos jovens afirmaram se sentir mais deprimidos, de acordo com a pesquisa do Saber. Em geral, 53% enfrentaram dificuldades para dormir, 44,3% ficaram mais cansados, e outros 34,8% sofreram com o aumento do apetite. “A pesquisa é um balizador para que as empresas entendam esse cenário e tenham um olhar mais humanizado”, diz.
Doença e morte
O maior temor relatado pelos jovens é contrair alguma patologia e morrer. De acordo com levantamento feito pelo Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube), a alternativa “doenças” foi escolhida por 26,76% dos participantes. Outros 18,77% (5.370) entrevistados afirmaram ter receio de perder a vida. Ao todo, 28.607 jovens de 15 a 29 anos participaram do processo, realizado entre os meses de junho e julho.
“Estamos acompanhando o aumento dos casos confirmados (da Covid-19) no país, e isso pode transparecer às pessoas como o vírus está próximo”, salienta a analista de treinamento do Nube Skarlett Oliveira, que acredita que a pandemia influenciou o resultado da pesquisa. “É muito importante nos mantermos atualizados neste momento. Porém, por conta de muita informação, a insegurança vai crescendo”, acrescenta ela, que orienta “a não focar assuntos sobre a doença no dia a dia, pesquisar somente dados essenciais e buscar fontes seguras para isso”.
Dinheiro e companhia
Para 16,20% dos entrevistados pelo Nube, o maior medo é enfrentar problemas financeiros. Outros 14,22%, ou 4.069 dos participantes, não querem enfrentar a solidão.
“O isolamento social se fez extremamente importante e praticamente obrigatório para nossa segurança e das outras pessoas. Então, agora, é legal buscar os benefícios da tecnologia e aproveitá-los ao máximo”, ressalta Skarlett Oliveira. “Faça chamadas de vídeo regularmente com familiares e até mesmo aquele happy hour virtual com os colegas para se sentir mais aliviado até a situação ficar melhor”, sugere a analista.
Legislação
O contrato do jovem aprendiz pode durar até dois anos. A capacitação dele é feita pela instituição formadora e pela empresa, combinando formações teórica e prática.