A temporada de processos seletivos para estágios começou com um dos maiores aumentos no número de vagas dos últimos anos. Após um período de estagnação durante a crise econômica, agências especializadas na orientação de jovens para o mercado de trabalho registraram uma retomada na demanda por estagiários neste ano.
E, pela primeira vez, se prevê um retorno aos patamares anteriores à recessão.
Em janeiro, cerca de 32 mil estagiários e aprendizes foram contratados por intermédio do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), um aumento de 19,9% em relação ao mesmo mês de 2017. A instituição diz que o resultado “indica claramente uma retomada” na abertura das vagas de treinamento no País.
O Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube), uma das principais plataformas de inscrição para estágios, prevê aumento de aproximadamente 9% em relação à última temporada. A agência espera que cerca de 35 mil vagas sejam oferecidas em seu site até o fim de março, quando termina o período de alistamento em muitos programas empresariais.
Caso a marca seja alcançada, seria o melhor resultado dos últimos oito anos. A entidade prevê que a recuperação econômica leve à abertura de um número de estágios, no mínimo, equivalente ao período pré-crise.
De 2015 para 2016, a quantidade de estágios oferecidos no primeiro trimestre no Nube caiu mais de 10% – de 34,5 mil vagas, o maior número até então, para 31 mil. No ano passado, as ofertas de estágio cresceram apenas 3%.
Para o professor da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP) Hélio Zylberstajn, o aumento nas vagas de estágio é um indicador de retomada da atividade econômica, entre outros sinais importantes. Ele diz que um aumento no número de vagas formais é esperado para este ano, após o índice de desemprego ter parado de piorar. “2017 foi um ano em que o País parou de perder emprego de todos os tipos, inclusive estágio”, diz.
“O jovem é a parcela mais vulnerável na contratação, e os estágios acompanharam esse dado do desemprego”, diz a gerente de treinamento corporativo do Nube, Yolanda Brandão. Ela avisa que os interessados devem ficar atentos aos prazos de inscrição, pois a temporada de estágios é também a época em que há mais desistências na procurar. “O primeiro trimestre é o período do ano que oferece mais vagas, mas também tem mais faltas porque muita gente está de férias ou curtindo o carnaval.”
Segundo o Nube, a média do pagamento inicial para estagiários aumentou 32% em relação ao ano passado, de R$ 800 para R$ 1.056. O valor das bolsas oferecidas pelas empresas na plataforma vai até R$ 2,6 mil.
Longevidade. A engenheira eletricista Renata Randi foi aprovada em seu primeiro estágio há 26 anos, quando estava no último semestre da faculdade. À época, sua maior preocupação era o tempo curto até sua formatura, quando teria de ser efetivada. “Será que só em seis meses eles vão saber se querem ficar comigo ou não?”, pensava. Hoje, Renata é diretora global de marketing e alianças na mesma empresa, de onde nunca saiu.
Quando entrou no estágio na Promon-Logicalis, que atua na área de tecnologia da informação e telecomunicações, seu departamento era responsável por projetar centrais telefônicas. Não demorou muito para perceber que seu perfil não se encaixava em uma área tão técnica da empresa. Seis meses depois da efetivação, ela migrou de equipe para ficar mais próxima ao departamento de vendas.
“Para mim, foi um período muito rico de experimentação”, conta Renata. Alguns anos depois, ela cursou um MBA com foco em marketing e começou a assumir cargos de gestão. “Fiz estágio numa área muito técnica e foi muito importante, porque naquele momento eu descobri que aquela atividade não era para mim.”
A trajetória é parecida com a de Fabrizio Tassitano. Ele estudava Sistemas de Informação quando se tornou estagiário da Mercado Eletrônico, que presta serviços de tecnologia para empresas, há 14 anos.
Tassitano achava que sua maior vocação era como programador de softwares. Após entrar no estágio, porém, começou a se interessar cada vez mais pelas áreas de negócios e atendimento a clientes. Hoje, ele é diretor de produtos.
A carreira evoluiu junto com o crescimento da empresa. Quando o diretor ainda era estagiário, a Mercado Eletrônico tinha cerca de 110 funcionários. Hoje, são 230. “Fui migrando (de departamentos) mesmo como estagiário”, lembra Tassitano. “Meu perfil era mais técnico, e eu fui percebendo que poderia agregar mais na área de entrega e desenvolvimento de projetos. E percebi que não queria mais programar.”
Personalidade interfere na avaliação, dizem recrutadores
Nos processos seletivos para estágio em grandes empresas, os critérios de avaliação costumam ser baseados menos nas habilidades técnicas dos candidatos e mais em características pessoais. Capacidade de relacionamento, inteligência emocional e proatividade estão entre as qualidades mais valorizadas. O perfil do estagiário ideal, porém, varia de acordo com a vaga e o contratante.
O primeiro passo da seleção é o cadastro de currículos, geralmente em plataformas. Um erro decisivo nesta etapa é não preencher corretamente os formulários de inscrição – muitos não completam sequer as informações obrigatórias. Quanto mais campos preenchidos, maior a chance de ser selecionado para a próxima etapa, dizem especialistas.
“É com base nas informações que estão registradas lá que vamos chamar ou não o candidato para uma possível entrevista”, diz o superintendente de atendimento do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), Luiz Gustavo Coppola. “Ele (candidato) deve estar atento ao perfil da vaga, se ele se enquadra no que foi pedido.”
Experiência em trabalhos voluntários, monitorias ou mesmo funções temporárias, feitas durante as férias, por exemplo, contam pontos tanto no currículo quanto na discussão durante a entrevista. Segundo recrutadores ouvidos pelo Estado, em vez de soar como clichê, o trabalho voluntário durante os anos de faculdade e ensino médio demonstra que o candidato tomou iniciativa para exercer alguma atividade. “O que tem de mostrar é que a pessoa se movimentou,” diz a gestora de capital humano da consultoria Thomas Case, Márcia Vazquez.
O mesmo vale para as dinâmicas de grupo, segundo Márcia. Além de verificar como os candidatos se relacionam com colegas, as empresas querem identificar quem demonstra iniciativa na solução de problemas. “Se eu quero crescer numa carreira ou numa empresa, preciso me libertar dessa estabilidade.”
A gerente de treinamento corporativo do Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube), Yolanda Brandão, concorda: quem fala pouco tem chances menores de se destacar. “Numa dinâmica de grupo, só se consegue avaliar aquilo que o candidato mostra”, ela diz. Para as entrevistas, a recomendação é pesquisar o perfil da vaga e da empresa. É nessa etapa que ele terá de mostrar por quê resolveu se candidatar. “Ele precisa saber se essa vaga tem a ver com a perspectiva e com o planejamento de carreira dele”, afirma Yolanda.