Os últimos dias movimentaram o mundo e colocaram milhões de telespectadores de olho nas Olimpíadas de Tóquio. Depois de tanto tempo de isolamento social, a hora de acompanhar o desempenho dos atletas e torcer pelas estrelas do esporte veio e já se foi. Chegar ao Japão exigiu – para esportistas e equipes – muito preparo e equilíbrio para superar não apenas os concorrentes, mas principalmente a ansiedade e a angústia da espera forçada pela pandemia.
Contudo, o que temos a aprender com o desempenho, a performance e os comportamentos dos competidores com relação ao universo corporativo? A especialista em gestão e liderança, Luciane Botto, avaliou as últimas semanas e destacou algumas lições possíveis para a vida.
Segundo ela, “aprender com a experiência do outro, em situações tão reais e emocionantes como as acompanhadas nas telas, nos dá a oportunidade da reflexão por meio do lúdico, da dor e da superação. Todo mundo deseja vencer, mas é interessante pensar como a experiência não se faz apenas de vitoriosos. Nem sempre ganha quem domina a técnica, mas aquele com a capacidade de usar suas habilidades comportamentais para lidar com o estresse da competição em si”, enfatiza a consultora empresarial.
Nesse sentido, Luciane destaca três atletas e posturas consideradas importantes para reflexão:
Ítalo Ferreira: o surfista brasileiro ganhou a primeira medalha de ouro do Brasil nos jogos de Tóquio. Em seu depoimento à imprensa, falou como aquele momento representava a concretização de um sonho, pelo seu amor ao surf e por ter conseguido entrar no mar sem sentir-se pressionado.
Rayssa Leal, a brasileirinha de 13 anos precisou viajar acompanhada da mãe - conquistou a prata no skate street feminino e se tornou a medalhista mais jovem do Brasil. Foi leve, dançou antes de entrar na pista, não absorveu estresse e fez o seu melhor.
Já a estadunidense, Simone Biles, a tão esperada rainha da ginástica olímpica dos últimos anos, trouxe uma lição ao mundo ao desistir da final de Tóquio e revelar como o seu maior desafio, no momento, a saúde mental. “Temos de proteger nossas mentes e nossos corpos. Não somos apenas atletas, mas pessoas e às vezes é preciso dar um passo atrás”.
A justificativa para a desistência da favorita ao título fala por si só e nos mostra como Simone é vencedora mesmo quando assume sua fragilidade e pensa em si. Como bem citou o psicólogo organizacional americano, Adam Grant, “por gerações, as ginastas sofreram abusos e sacrificaram seus corpos para nosso entretenimento. Simone Biles é o modelo para mudar essa cultura tóxica”.
Das quadras para os escritórios
Acostumada a trabalhar com líderes de empresas em diversos ramos, Luciane relata como esse conjunto de posturas e situações esportivas a fez pensar nos desafios da área corporativa. “Tem algo despertando a atenção nessas modalidades e permite fazer um paralelo com a vida: o surf diante da maré de incertezas as quais estamos vivendo e a importância de sairmos da zona de conforto, focarmos e nos adaptarmos aos diferentes cenários e mudanças”, explica.
O skate, por sua vez, serve de exemplo porque “sempre podemos encontrar oportunidades para ousar, aprender algo novo, nos superarmos e acima de tudo, nos divertirmos. A ginástica revela a importância da nossa flexibilidade e do autoconhecimento, no sentido de descobrir nossos limites. Para todos esses obstáculos, surge a necessidade da coragem e da inteligência emocional”, explica.
Veja as lições:
1) Preparo é necessário para superar desafios e alcançar objetivos. Não há como esperar resultados melhores sem o compromisso de atualização constante. Cursos, leituras, experiências nos fazem sentir mais preparados e confiantes.
2) Autoconhecimento para descobrir o seu limite, não depender da aprovação do outro para tomar decisões, saber “dizer não” e superar o “medo de errar” são alguns dos maiores desafios enfrentados pelas pessoas. É preciso ser tão duro com si mesmo? Como seria equilibrar melhor as prioridades, operando de modo saudável?
3) Resiliência consiste em ter a capacidade de olhar para o copo cheio e não levar tudo “a ferro e fogo”. Implica na capacidade de extrair lições de experiências, ter orgulho da sua história, das suas conquistas e tudo trilhado, de virar a página e seguir em frente.
4) Empatia e apoio para compreender os sentimentos do outro e ter sensibilidade para observar quando a produtividade cai, quando se está no limite e ter condições de oferecer apoio e liberdade para ele se expressar com autenticidade. O que os times esperam dos líderes em momentos críticos, de tensão ou pressão? Sem dúvida, eles desejam direção, apoio, reconhecimento, escuta e compreensão verdadeira.
5) Cuidados com a saúde física, mental e emocional. Sem equilíbrio não há performance para se sustentar. Momentos de pausa, meditação, diversão, interação e atividade física nos ajudam a ter mais foco e prazer nas atividades realizadas. A disputa acontece todos os dias e o mais importante é se manter em movimento, na velocidade possível – não a qualquer custo.
6) Mantenha a humildade para ganhar e perder, pois nem sempre temos as melhores ideias, soluções ou respostas. Às vezes não estaremos no topo. É preciso aprender com as vitórias e derrotas. Em uma competição, um lado ganha e outro perde.
7) Desafie suas métricas ou “verdades absolutas”. O comando, controle e a pressão trazem os melhores resultados? Ou o ato de mesclar talento, paixão, leveza e diversão são capazes de nos fazer ir além? “Lembre-se: o resultado é só a ponta do iceberg. Considere anos de dedicação, foco, treino e suor nos bastidores”.
No fim, segundo a especialista, independentemente de ser com vitória ou derrota, conseguimos perceber como o importante vai muito além da medalha. “Saber quem realmente você é, com quem você pode contar, celebrar ou chorar”, conclui.