Durante muito tempo, os quadrinhos foram vistos como um material inadequado para ser trabalhado em sala de aula e atividades escolares. Com o passar dos anos, a evolução dessas obras e a diversidade de meios de comunicação do cotidiano dos alunos, tal recurso tem sido cada vez mais utilizado por professores. Isso evidencia uma infinidade de possibilidades didático-pedagógicas.
De acordo com Norton Frehse Nicolazzi Junior, coordenador da assessoria de história, filosofia e sociologia do Sistema Positivo de Ensino, as HQs atualmente se constituem em uma das inúmeras possibilidades de trabalho com conteúdos de história nas classes. “Podem ser o ponto de partida para abordar um determinado tema, servir como complemento para aprofundar um conteúdo e se tornar estímulo para um debate”, destaca.
Dependendo da utilização do mestre, esse recurso tem se mostrado um poderoso auxílio para o desenvolvimento dos objetivos propostos na disciplina. O coordenador argumenta como esse tipo de livro permite a análise de questões de um determinado período histórico, especialmente relacionados às condições políticas, econômicas e sociais do Brasil.
Ainda de acordo com ele, é possível extrapolar a análise, propondo a realização de comparações com outras regiões do mundo na mesma época. “Isso nos dá condições de conectar os fatos narrados com alguns aspectos da Europa, como a expansão imperialista napoleônica, além do desenvolvimento econômico e industrial inglês, por exemplo", explica.
O educador cita alguns exemplos de obras trabalhadas com sucesso em aulas.
- A HQ de Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida, permite analisar hábitos e costumes do Brasil oitocentista;
- Casa-grande & Senzala em quadrinhos faz a análise de uma determinada interpretação, no caso, a do sociólogo Gilberto Freyre, propiciando um contato com uma obra fundamental para o entendimento do país;
- A obra D. João Carioca: a corte portuguesa chega ao Brasil (1808-1821), do quadrinista Spacca e da historiadora Lilia Moritz Schwarcz, aborda o tema da chegada da Família Real portuguesa ao território nacional, no ano de 1808;
- Da Colônia ao Império: um Brasil para inglês ver e latifundiário nenhum botar defeito, de Miguel Paiva e Lilia Schwarcz. A obra tem início com o episódio de 7 de Setembro, para depois voltar no tempo e analisar os principais eventos e processos responsáveis por conduz o país à Independência;
- Cai o Império! República vou ver!, de Angeli e Lilia Schwarcz. Os autores abordam o período desde do Golpe da Maioridade (1840) até a Proclamação da República. Quatro personagens contemporâneos participam da narrativa, olhando criticamente os acontecimentos e personagens, dialogando com os escritores.
O Ministério da Educação já se manifestou em relação ao tema e assegura o consumo desse tipo de produto como um processo bastante complexo por parte do leitor. Afinal, ele se depara com escrita, imagens, caixas de diálogo, ordem das tiras e onomatopeias as quais contribuem significativamente para a independência na interpretação dos textos lidos.
Nicolazzi explica como a comunicação verbal em cada vinheta pode assumir variados padrões, sendo mais comum a utilização do balão. "A interpretação da mensagem contida demanda um processo de decodificação capaz de ultrapassar a simples tradução da frase apresentada. É necessário levar em conta outros elementos presentes, fazendo o aluno exercitar a integração da leitura de um conteúdo com a análise de uma imagem", detalha.
A mescla de linguagem visual e verbal, características próprias das HQs, é muito bem aceita pelos estudantes, desde os anos iniciais do ensino fundamental até o médio. “Varia a complexidade do quadrinho a ser utilizado. Esse recurso estimula o interesse de quem aprende a um determinado conteúdo, pois ajuda a construir as informações responsáveis por propiciar o desenvolvimento do próprio conhecimento", finaliza.
Vinicius Alves é graduando em letras e, embora nunca tenha visto em sua jornada acadêmica até o colegial, planeja colocar em prática esse tipo de recurso quando for professor. “Comecei a graduação já pensando em lecionar. Quando isso acontecer, preciso entender meios de reter a atenção de todos, seja com uma abordagem mais divertida ou mais formal”, comenta.
Para ele, considerar diversas oportunidades para transmitir conhecimentos, principalmente para crianças e adolescentes, é essencial. “Ainda mais na realidade digital de hoje, não quero escrever diversos parágrafos em uma lousa e esperar a absorção de conteúdos apenas dessa forma”.
Você conhece a jornada do aprendizado?